O Outro Lado: A felicidade e as ambições de Luís Lavoura numas rouparias "de se lhe tirar o chapéu"

No futebol, os sonhos não se fazem apenas dentro das quatro linhas. Fora delas, há metas a atingir, carreiras para construir e desejos por cumprir. Luís Lavoura é um bom exemplo disso. Roupeiro há 25 anos, já passou por cinco clubes e não esconde o objetivo de chegar à 1.ª Liga. “A vida é feita de sonhos e temos de acreditar nisso, senão ela não tinha sentido”, desabafa. E são eles, de facto, que nos fazem ser melhores a cada dia.

Atualmente ao serviço da AD Sanjoanense, Luís sempre teve um gosto especial por este tipo de trabalho. “Vou ao campo de manhã para preparar tudo. Vejo as bolas, os coletes, lavo tudo. Volto à tarde para ir adiantando tudo, para que, quando chegarem os treinadores, cada um saiba qual é o seu saco. Gosto de ter tudo ao pormenor. Acho que nasci para isto”, refere.

A primeira experiência enquanto roupeiro foi no GD São Roque, há 25 anos, e o impacto foi imediato. “Nessa altura, elegeram os melhores roupeiros do distrito e eu fui um deles, mas isso não quer dizer nada”. Alguma coisa quererá dizer, e não terá sido à toa que CD Arrifanense, CD Feirense e FC Cesarense o tenham recrutado. “Andei sempre a subir, degrau a degrau. Pelos clubes por onde passei, sou considerado um dos melhores”, atira, ainda que tenha sido em Cesar onde viveu os melhores momentos.

“Foi o convívio, as brincadeiras. Nunca passei por algo igual”, confessa. Certa vez, os jogadores colocaram-no dentro do saco das bolas e cobriram-no com elas. “Andaram muito tempo à minha procura. Ninguém sabia de mim, mas eu estava lá”, recorda, entre sorrisos. “Também tínhamos um guarda-redes, que foi dos melhores que vi, porque defendia tudo, que era tratado como elefante Dumbo. Sempre que ele entrava numa sala, eu batia os pratos e dizia-lhe que o circo já tinha fechado. São recordações eternas”, acrescenta.

Foi também no Mergulhão que Luís conheceu os treinadores que mais o marcaram, Martelinho, João Alves e Pedro Alves. “São pessoas que nunca vou esquecer, pela sua humildade. No meu trabalho, alguns treinadores são muito exigentes e querem tudo tudo, mas nem sempre pode ser. Há clubes que não podem dar tudo o que se quer, mas para esses treinadores qualquer coisa servia”, lembra, acrescentando Vasco Coelho, Amílcar, o professor Martinho e o senhor Rui na lista de pessoas com quem criou uma relação forte no futebol.

Mesmo sentindo-se feliz na AD Sanjoanense, Luís Lavoura continua a olhar para cima sempre que lhe perguntam sobre o futuro. “Sempre gostava de chegar à 1.ª Liga. Tenho fé nisso, mas esse é um patamar que não é para toda gente”, bem sabe, salientando que “é preciso ter sorte e lutar por isso”. Caso não o venha a conseguir, não haverá drama, garante: “Se não o conseguir, fico feliz onde estou. Tenho de estar num clube em que me sinta bem, senão não vale a pena, mesmo que ganhe uma pipa de dinheiro”.

Há momentos que valem bem mais do que uns meros euros. Como quando, ainda esta semana, Jorge Vultos Sequeira, presidente da Câmara de São João da Madeira, visitou a rouparia do Centro de Formação da cidade para lhe dizer que aquilo que viu “era de se lhe tirar o chapéu”. “Gosto de ouvir isso. É sinal de que o trabalho é reconhecido. Pelo que vejo por aí, não é fácil ter uma rouparia como a minha. Pode existir igual a mim, mas melhor não é fácil”, conclui.

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24 de Abril de 2021
Rui Santos
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