O líder nato e resiliente que o SL Benfica descobriu em Manu Silva

É de Santa Maria de Lamas, freguesia no concelho de Santa Maria da Feira, o protagonista da transferência mais avultada entre clubes portugueses no último mercado de inverno. Manu Silva despontou no clube da terra, chegou ao futebol profissional no CD Feirense SAD e, aos 23 anos, dá nas vistas no meio-campo do SL Benfica. Uma história de resiliência, mas também de talento e personalidade bem vincada, atributos essenciais para vingar no exigente mundo do futebol.

Filho de Jorge Silva, antigo médio e treinador do CF União de Lamas, Manu desde muito cedo demonstrou vontade em seguir os passos do pai. Juntou-se ao clube lamacense ainda em criança, mas já então se “notava que era um miúdo diferenciado, um líder”.

Quem o diz é o seu primeiro treinador, Gustavo Silva, que tinha em Manu a sua extensão dentro do balneário. “Foi o meu capitão durante os seis anos que estive com ele no União de Lamas, sempre com um sentido de responsabilidade enorme e uma maturidade muito desenvolvida para a idade. Nunca tive de me chatear com ele, o que naquelas idades é quase impossível, porque estamos a falar de miúdos, por norma irreverentes. Ele tinha sempre a postura correta”, nota.

Esses atributos foram potenciados nos tempos em que o agora jogador do Benfica praticou karaté, modalidade que conciliou com o futebol ainda em criança.

“Às vezes, ia a entrar no balneário para dar um 'sermão' à equipa ou para corrigir alguma coisa e o Manu já estava 'em cima'. Não era preciso dizer nada, ele era incrível nesse aspeto. Nunca tive nenhum miúdo com essa maturidade, sentido de responsabilidade e liderança. Bastava ele dizer uma palavra que iam todos atrás dele. Sempre foi um grande líder”, recorda Gustavo Silva.

Em campo, Manu cedo encontrou a sua vocação. Era no meio-campo, tal como o pai, que queria jogar, desejo que uma “leitura de jogo muito acima da média e um último passe muito bom” ajudavam a dar corpo. “Era um médio muito bom a nível tático, com uma visão de jogo fenomenal e muito combativo”, completa o perfil, Gustavo Silva.

O fã de Matic que sonhava com grandes palcos
Um médio à imagem de Nemanja Matic, internacional sérvio que em Portugal jogo pelo SL Benfica e que Manu cresceu a admirar. “Era o jogador de quem mais me falava”, recorda Filipe Avó, que com ele partilhou o balneário no CD Feirense durante a adolescência.

“Passei com ele quase a minha formação toda. Vivemos muitos bons momentos juntos. Aprendi muito com ele e ele comigo, acho eu. Ele ensinava-me posicionamentos, trocávamos ideias e, como pessoas, fomos evoluindo juntos”, diz o agora médio da ADC Lobão, do Campeonato SABSEG, que recorda os tempos em que, ainda aspirantes em poderem fazer carreira no futebol, sonhavam com os grandes palcos do futebol português.

“Éramos uma geração com muita qualidade, no Feirense. Naquela altura, ainda crianças, dizíamos 'quem me dera jogar no Benfica ou no Porto...'. Todos idealizávamos isso e fazíamos planos na cabeça, como se estivéssemos a jogar no Dragão, em Alvalade ou na Luz. Mas nunca pensámos que, realmente, fosse acontecer com algum de nós porque é muito difícil. Ainda bem que o Manu conseguiu, fiquei muito orgulhoso por ele”, partilha Filipe Avó.

A ideia é partilhada pelo primeiro treinador de Manu. “Sabemos que, se calhar, só dois em mil (futebolistas) conseguem lá chegar”, nota Gustavo Silva, que, “a nível técnico, se calhar tinha jogadores melhores (do que Manu), mas não na mentalidade”, e isso, no futebol, vale ouro.

Resiliência ajudou a superar fases menos boas
Estamos ainda longe de perceber se a liderança é um atributo inato ou se, por outro lado, é possível de desenvolver, mas no campo científico há estudos que relacionam os genes a essa capacidade.

Não sabemos se o caso de Manu poderia entrar nessa amostra, mas ter um pai futebolista, “um grande craque do União de Lamas” como o define Gustavo Silva, ajudou certamente. Jorge Silva foi sempre um pai presente nas várias etapas de desenvolvimento do filho. “Ele dava-lhe uma liberdade terrível. Era máxima liberdade, máxima responsabilidade. Não intervinha no jogo e deixava-o à vontade. De certeza que, em casa, dava-lhe conselhos, mas era supertranquilo”, recorda Gustavo.

A qualidade evidenciada nos escalões de formação do CD Feirense, competindo em campeonatos nacionais, levaram a SAD a blindá-lo com um contrato profissional com apenas 17 anos. O potencial que todos lhe reconheciam no clube não foi, porém, garantia de sucesso imediato para Manu, que demorou a impor-se na equipa Sub-23 e esteve em campo durante apenas 20 minutos na primeira época em que integrou a tempo inteiro o plantel principal dos 'fogaceiros'.

Essa terá sido a maior provação por que passou na carreira. Sem espaço na equipa, chegou a pensar em mudar de ares, mas a sua resiliência acabaria por dar frutos. Isso e quando começou a ver o ginásio como um meio de poder dar um passo em frente no seu processo evolutivo, tornando-se a partir daí num jogador de eleição.

Se a certo ponto, no CD Feirense SAD, chegou a haver jogadores a pedirem aos treinadores uma oportunidade para Manu, a dada altura ele viu-a chegar com alguma naturalidade, dada a sua evolução. A polivalência, que ainda hoje lhe permite atuar como defesa central ou médio defensivo, ajudou-o a somar minutos numa fase inicial, tornando-se a partir daí numa figura importante da equipa, então orientada por Rui Ferreira.

Em janeiro de 2023, o Vitória SC investiu 325 mil euros por metade do seu passe e, dois anos depois, vê-o sair para o SL Benfica por uma verba que pode atingir os 14 milhões de euros.

“O que lhe está a acontecer é ótimo e era algo expectável”, acredita Gustavo Silva. “O Manu teve o mérito e a sorte de conseguir patamares muito altos. Quando ele foi para o Benfica, desejei-lhe felicidades. Somos muito amigos na mesma. Estamos mais distantes, não temos tido tanto contacto, mas qualquer coisa de que precisemos sei que estamos lá um para o outro”, acrescenta Filipe Avó.

Na estreia como titular no Benfica, Manu foi eleito o melhor jogador em campo, na vitória dos 'encarnados' frente ao Estrela da Amadora (2-3), para a Liga Portugal Betclic. Um sinal de que algo de maior ainda estará por vir. Curiosamente, o irmão, Luís, de 14 anos, também ele médio defensivo, é uma das figuras nos Sub-15 do CD Feirense. Os genes não mentem.

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CD Feirense - Futebol, SAD | Vitória Sport Clube | Sport Lisboa e Benfica

8 de Fevereiro de 2025