Ana Sofia e Patrícia, as Coordenadoras que querem desmistificar a função

São mulheres e são também as responsáveis pela Coordenação do futsal do SC S. João de Ver e da ACD Gião. Ana Sofia e Patrícia Almeida agarraram as oportunidades dadas pelos dois clubes da Associação de Futebol de Aveiro (AFA), uma das entidades que mais mulheres forma a cada época, e contam à AFA TV os desafios e a ambição em torno da função.

Ana Sofia: “Sinto-me especial por conseguir fazer aquilo que gosto”

Chegou ao SC S. João de Ver “com a ideia de ficar com uma equipa”, mas, “por força de algumas situações que foram acontecendo”, acabou por “assumir a parte sénior”.

“Eu estava com a formação, mas só havia uma equipa, sendo que depois entraram mais algumas meninas e acabámos por criar uma segunda. A coordenação foi algo inerente a isso. Comecei a assumir e a coordenar tudo, mas não foi algo que tivesse como objetivo quando fui para o clube, porque ia só com a intenção de treinar a equipa Júnior. Depois, acabei por ficar com as seniores, para ajudar, e assumi também a coordenação. Foi acontecendo”, explica Ana Sofia, sobre “um papel com o qual estava identificada e para o qual já estava preparada”, uma vez que já o havia desempenhado no Novasemente GD, clube que representou anteriormente.



No dia-a-dia do clube, “há várias tarefas” a realizar, “desde a coordenação dos treinos à dos jogos”, mas “a função principal, ou a mais vincada, é permitir que haja um trabalho contínuo entre todos os escalões do clube”. “Não queremos um treinador que chegue e coloque as suas ideias em prática, sendo que no ano seguinte pode vir outro com ideias diferentes. Se não houvesse um trabalho contínuo, até a passagem de atletas entre escalões seria dificultada. O facto de haver alguém que tem noção de tudo o que é feito e que sabe o que é para desenvolver em cada escalão, faz com que essa transição seja mais simples e eficiente”, sustenta a responsável.

Constantemente desafiada a “encontrar um padrão, porque temos uma ideia delineada e o que acontece é que há atletas que entram e acabam por suscitar dúvida sobre a abordagem a adotar”, Ana Sofia avalia de forma positiva o trabalho feito até ao momento. “Tendo em conta o ano em que começámos, que foi o da pandemia, as dificuldades inerentes e o início de um projeto num clube que não tinha futsal feminino, acho que estamos a fazer um bom trabalho. Ainda estamos no início, temos objetivos concretos do que pretendemos, mas creio que estamos a conseguir atingir as metas a que nos propusemos”, sublinha, garantindo não se sentir especial pelo papel que desempenha no SC S. João de Ver, mas sim por fazer aquilo de que mais gosta.

Eu sinto-me especial por conseguir fazer aquilo que gosto. O trabalho é que vai fazer com que sejamos reconhecidas ou não. O futsal foi sempre muito ligado aos homens, mesmo para jogar, porque havia uma ideia antiga de que o futebol e o futsal não eram para mulheres. Essa ideia foi-se desmistificando aos poucos, primeiro com as jogadoras e, agora, com mais treinadoras e coordenadoras”.

“A competência não tem a ver com género, mas sim com trabalho”

Ciente de que a aposta nas mulheres para cargos de decisão é ainda embrionária, Ana Sofia defende que “a competência traz maior abertura” para o sexo feminino. “E a competência não tem a ver com género, mas sim com trabalho. Sinto-me uma felizarda, não por ser Coordenadora, mas por fazer aquilo que gosto”, vinca, destacando ainda que tanto ela como Patrícia Almeida estão “a desmistificar a posição das mulheres, mostrando que também trabalhamos bem”.

“Sinto que, aos poucos, as pessoas vão tendo essa ideia. Agora, é evidente que as opiniões evoluem consoante surjam mulheres que mostrem que isto é verdade. Porque se começam a aparecer mulheres que não mostrem competência, se calhar as portas não vão abrir-se tanto”, alerta.

Patrícia Almeida: “Remamos todos para o mesmo lado e em prol dos atletas da formação”



A relação entre Patrícia e a ACD Gião já não é de agora e foi também isso que esteve na base do convite que lhe foi endereçado numa altura em que os escalões de formação do clube, que se iniciaram “há coisa de quatro anos”, iam “crescendo a cada ano”.

“Era importante ter alguém que assumisse a coordenação do departamento de formação, essencialmente, e depois acabámos por abraçar também o plantel sénior, para que tudo estivesse interligado e a ser gerido por uma pessoa só. O convite foi feito pela direção, já trabalhávamos juntos há muito tempo e, por isso, foi fácil de aceitar”, conta-nos a responsável pelo futsal em Gião.

Como parte da função, Patrícia supervisiona tudo o que diga respeito à coordenação, “desde orientar os inícios de época, a encontrar treinadores, estabelecer e dar a conhecer os objetivos, os manuais e as regras, e tentar incutir os nossos valores desde a chegada de novos membros ao clube, para que todos estejamos em sintonia para levar o barco a bom porto”. Um trabalho árduo, que, diz, tem por base a dinâmica de “pessoas fantásticas”.

“Remamos todos para o mesmo lado e em prol dos atletas da formação, que são o mais importante para o clube neste momento”, acrescenta, revelando que esteve sempre “ligada ao desporto, principalmente ao futsal”, e que assumir a coordenação de um clube era “um dos objetivos” que alimentava.

O “aumento do número de atletas” é um dos desafios que a agarra à missão, mas existem também as vertentes desportiva e social, que ganham especial destaque. “Queremos alcançar feitos importantes para o clube, como a chamada de atletas para as seleções distritais ou a inclusão de atletas com patologias nos nossos escalões de formação, através de protocolos com instituições de solidariedade social”, explica a responsável, sublinhando que feitos do género dão “muito mais destaque ao emblema e mérito às pessoas que nele trabalham” e garantindo que a ACD Gião faz por ser “um clube inclusivo”.

Com “um trabalho positivo”, marcado pelo “aumento do número de atletas todos os anos, principalmente na vertente feminina”, Patrícia aponta já às próximas metas. “É objetivo do clube, a curto prazo, avançar com a criação de escalões femininos em todas as idades. Neste momento temos cerca de 40 atletas do sexo feminino entre os 5 e os 15 anos, e isso faz com que queiramos ainda mais na próxima época”, revela.

“Um dos meus objetivos, enquanto mulher, é trazer ainda mais mulheres para o clube e para a modalidade”

Para Patrícia, uma estrutura solidária é o grande segredo de um trabalho bem desenvolvido, mas a Coordenadora não se esquivou na altura de indicar os princípios fundamentais que sente estarem na base da função. “Julgo que são a boa relação, o entendimento, a humildade, o trabalho e o respeito. São muito importantes na base de uma coordenação, porque não temos de mostrar que somos superiores por termos um cargo que, supostamente, é o maior da hierarquia”, sustentou.

“Se eu sou coordenadora, é porque tenho muitos braços direitos e esquerdos por trás. Eu sou a coordenadora e dou a cara, mas o trabalho é feito por todos”, reforçou, assegurando não se sentir “especial”, porque “todos os que trabalham em prol do clube são especiais”. Ainda assim, não esconde que “um dos objetivos” que tem, “enquanto mulher, é poder trazer ainda mais mulheres para o clube e para a modalidade”.

“Sinto que sou uma referência para as mulheres que trabalham cá no clube, que consegui trazer este ano, e sei que no futuro haverá ainda mais mulheres a exercer essas funções, porque somos tão ou mais capazes do que os homens”, atira, afiançando que, “como somos poucas, as que existem devem passar a mensagem, dar força e incentivar outras mulheres a ter essa vontade e o objetivo de chegarem à coordenação de um clube de futebol ou de futsal”.

Para Patrícia, o rumo é claro: “Nós, mulheres, temos de nos unir e fazer com que outras queiram atingir estes objetivos. Sinto, porque estou num meio um pouco pequeno, que ainda há muito o estigma da mulher no desporto. Temos uma luta todos os anos e julgo que estamos a conseguir melhorar isso aos poucos, porque as mulheres não estão associadas a desportos vistos como masculinos. É isso que queremos desmistificar, para conseguirmos trazer cada vez mais mulheres para o desporto”, conclui.

Fotografias: Direitos Reservados

24 de Março de 2023
Pedro Fernandes
pedrofernandes@afatv.pt
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